Brasil é segundo país que mais perde dinheiro com a depressão no trabalho
Esgotada e com baixa autoestima, pediu demissão. Mas os problemas continuaram em um novo emprego. Cristina Machado só percebeu que seus sintomas não eram sinais de incompetência quando outros colegas começaram a adoecer também.
“Atingi meu limite. Não conseguia nem chegar perto da empresa. Tive pânico. Mas não era só eu, havia jovens de 20 anos esgotados”, relembra a hoje funcionária pública e massagista de 45 anos, que trabalhou com telemarketing.
Cristina procurou um psiquiatra e ficou oito meses afastada. Nesse período, dedicou-se a um curso de massagem em busca de uma nova atividade e atendendo profissionais da mesma área em que trabalhava constatou que sua depressão não era um caso isolado ou pessoal.
Segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), essa será a segunda principal causa mundial de afastamento de profissionais no mundo até 2020. No Brasil, estima-se que 5,8% da população tenha a doença. A Previdência Social registrou, em 2016, o afastamento de 75,3 mil trabalhadores por causa de quadros depressivos —37,8% do total de licenças por distúrbios psíquicos. O país é o quinto no planeta em número de casos.
Fatores externos e internos podem levar a uma depressão no trabalho, que não escolhe nível de cargo ou profissão —embora quem atue com atendimento de pessoas, como enfermeiros e bancários, seja mais propenso.
“A pessoa começa a ter um esgotamento físico e mental. Ela pode até sentir prazer em outras áreas da vida, mas sofre queda de produtividade, insegurança, perda de concentração, cansaço. É o que chamamos [síndrome de] burnout, a depressão no trabalho. E muitas vezes isso é entendido como fraqueza”, explica Wagner Gattaz, diretor do Instituto de Psiquiatria da USP.
Funcionários doentes, que faltam ou não exercem seu potencial pleno, produzem menos. E isso gera prejuízos. Mais precisamente: US$ 246 bilhões (cerca de R$ 800 bilhões) por ano no mundo todo, segundo estudo de 2016 da London School of Economics feito em oito países.
O Brasil é o segundo com maior valor em perdas ligadas à depressão no trabalho, com US$ 63,3 bilhões (R$ 206 bilhões), atrás apenas dos EUA, com US$ 84,7 bilhões.
Segundo Mara Beckert, professora da Fundação Getúlio Vargas, consultora e escritora do Blog Mea (Mulheres Executivas em Ação), a questão da depressão já está na pauta do dia de muitas empresas, “mas ainda encontramos as que pararam no tempo da autocracia porque não perceberam a nova dinâmica do mundo corporativo”.
Eleito o 50º melhor local de trabalho de grande porte do país pela consultoria global do GreatPlacetoWork, o Consórcio Embracon coleciona exemplos de ações que visam o bem-estar dos funcionários, como comemorações, espaços de relaxamento e lazer, incentivos à leitura etc.
Também criou um serviço 0800 para atendimentos sigilosos e pontuais com psicólogos, advogados e consultores financeiros. Na maioria das vezes, uma orientação pelo telefone ajuda a resolver a questão que o aflige.
“Precisamos nos atentar para o limite de cada um. Exige-se muito mais das pessoas que, por necessidade, acabam cedendo sem ter a capacidade de arcar com a demanda”, afirma Brenda Donato, gerente da área de Pessoas & Resultados do Embracon.
“Ao primeiro sinal amarelo, é importante uma reflexão sobre o que está fazendo aquele profissional ficar tão mal. É o chefe? O ritmo do expediente? O excesso de cobrança? São os colegas?”, completa Sulivan França, presidente da Sociedade Latino-Americana de Coaching.